quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Eduardo: “Mudar, retomar a esperança, conquistar crescimento com soberania”


Publicamos a intervenção do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, que compareceu ao III Congresso do PPL
É uma emoção chegar aqui e encontrar muitos amigos que eu herdei. Amigos da minha família, pessoas que viveram momentos muito importantes da luta popular brasileira aqui no Brasil e no exílio. Pessoas que conviveram com meus tios, com meu avô, com meus amigos. Pessoas que povoaram a minha infância, a minha adolescência e minha formação política. O que nos une aqui é exatamente o sonho, que embala nossas vidas, de construir um país mais justo, mais equilibrado e um país soberano. Um país onde não tenhamos que conviver com o constrangimento das desigualdades, dos desequilíbrios que ainda povoam a vida brasileira.
A história sempre nos colocou do mesmo lado, no mesmo campo, pelejando cada um da sua forma, com mais ou menos intensidade, com compreensão às vezes diversa da atitude mais certa, mas o rumo estratégico da nossa caminhada sempre foi o mesmo.
O PSB e os companheiros do PPL sempre foram pautados pelos valores daqueles que lideraram nossa formação política: a preocupação central com o popular e com o nacional, a necessidade de afirmar a soberania brasileira como valor estratégico para construir a cidadania e a melhoria da vida do nosso povo.
A importância de emancipar o nosso povo, de construir um povo que tenha consciência da nação, de seus direitos, da sua força, da sua capacidade de transformar, que parecem aos que não têm crença impossível de transformar - nessa caminhada nós fomos ajudando e o PPL prestou esse serviço. O PPL foi ajudando a formar quadros para a vida pública brasileira, a formar pessoas que pensam, formulam, animam, questionam. E foram tantos, com quem pude conviver desde o movimento secundarista, estudantil, nas fábricas, nos bairros, na luta pela terra, na luta pelo chão nas cidades.
Nesse processo nós vivemos alguns pactos políticos, pactos políticos que representaram pactos sociais exigidos pelo momento histórico brasileiro. Um importante pacto político, que teve a presença de vocês e a nossa, foi a reconstrução democrática deste país, que custou a vida de muitos militantes e a coragem de tantos outros. Um exemplo de bravura de militantes ainda hoje anônimos, que nos ajudaram a resistir, a poder ir cravando no caminho as estacas necessárias para a reconstrução da institucionalidade brasileira no processo de redemocratização brasileira, tão bem simbolizada pela nossa Assembleia Nacional Constituinte, que teve a participação de todos nós, da luta da sociedade, que se expressou num Congresso que ainda não tinha, como não tem ainda hoje, a representação que gostaríamos que tivesse, as preocupações que gostaríamos que tivesse.
Nesse processo de redemocratização, para que o Brasil seguisse adiante na sua luta, para que o país reencontrasse um projeto de desenvolvimento que cumprisse o papel do crescimento, mas também o papel da sustentabilidade, da inclusão, da possibilidade de gerar um outro quadro social no país, vimos a dívida, tão questionada pelo PPL e pelos seus militantes, sufocar o crescimento do país por duas décadas de submissão absoluta a uma política que nos era imposta de fora para dentro, por governos que capitulavam efetivamente diante da banca, que faziam exatamente o receituário mais duro, para garantir os interesses de uns e negar os interesses do povo.
Vimos que essa luta construiu os espaços para que o Brasil pudesse por fim a um ciclo de duas décadas em que foi efetivamente jogando fora oportunidades, talentos, pessoas, empresas nacionais que foram sendo derrotadas - setores estratégicos da nossa economia onde o Brasil tinha posicionamento importante e fomos perdendo exatamente pela falta de um pensar estratégico, de um pensamento nacional.
Foi assim na área de medicamentos, foi assim no setor metal-mecânico, foi assim no setor de semicondutores, foi assim no setor naval, foi assim no petróleo, foi assim em várias áreas em que o Brasil foi perdendo oportunidades e efetivamente levando um processo que ainda perdura, por exemplo, na redução da nossa indústria na formação das riquezas nacionais.
Esse processo teve com certeza um momento diferenciado nos últimos anos, quando, calcado na estabilidade que nós conquistamos da economia brasileira - e não podemos de forma nenhuma negar que é um pressuposto importante a um processo de desenvolvimento conseguir fundamentos macroeconômicos mais sólidos e conseguir a estabilidade, pois a ausência da estabilidade corrói sobretudo a renda da classe trabalhadora – vemos exatamente o país se preocupar com o grande freio que havia a um crescimento mais pujante da nossa economia.
Porque, mesmo pondo fim a um ciclo inflacionário perverso - por formas que podemos divergir e criticar - nós vimos que isso não foi suficiente para o Brasil retomar um crescimento assemelhado aos seus vizinhos, ou assemelhado ao crescimento do mundo.
Percebemos que a questão social, a questão da desigualdade, era efetivamente um grande freio ao crescimento brasileiro. Todos nós que defendemos o desenvolvimento nacional, sempre chamamos a atenção, lendo os grandes economistas ligados ao nosso campo político, que um país como este não podia renunciar à possibilidade de ter um mercado interno pujante, capaz de reduzir as desigualdades, como um Brasil que poderia incrementar o ciclo de expansão econômica.
Vivemos no governo de presidente Lula um ciclo de inclusão social importante, onde muitos brasileiros, sobretudo os das regiões mais pobres, tiveram a oportunidade de carimbar sua carteira, de abrir um pequeno negócio, de ter direitos a políticas até então negadas pelo Estado brasileiro - que sempre esteve distante de um Brasil real, um Brasil oficial cada vez mais encastelado - e vimos os efeitos desse iniciar de uma justiça social, incipiente, que teve a capacidade de mudar o patamar do crescimento econômico brasileiro.
Nós saímos dos minguados 2% para a casa dos 4% de crescimento médio de 2002 a 2010, nos assemelhamos assim ao que acontecia na América Latina, e com o que acontecia com o mundo.
Mas nós precisávamos, pelo que ficou das décadas perdidas, acelerar até um pouco mais esse crescimento econômico. E fomos atingidos pela maior crise do capitalismo, na sua expressão de capitalismo financeiro, pela irresponsabilidade absoluta de uma banca desregulada que fraudou aplicações e que derreteu trilhões e trilhões de dólares de muitas pessoas que, ingenuamente - e outras não tão ingenuamente assim - depositaram no sistema financeiro suas poupanças, com as quais os derivativos engordaram as burras de muitos e quebraram tantos outros.
A partir dali, cinco anos se passaram. Anos que não têm sido nada fáceis para várias nações mundo afora. Anos que têm sido desafiadores para o Brasil. Em 2009, nós sentimos o efeito desse freio, esse freio que vem de fora, esse freio que surpreendeu a uns, mas não a outros. Um freio que fez o Brasil sacar um conjunto de ferramentas macroeconômicas, claramente keynesianas, que permitiu em 2010 já termos um crescimento de 7,5%. E aí, talvez, esse crescimento tão comemorado, sobretudo se tratando de um ano eleitoral, tenha tirado do nosso campo a possibilidade de fazer um debate mais profundo, sobre o significado de uma crise do capitalismo dessa proporção.
Tínhamos passado duas décadas onde os ventos neoliberais impuseram quase que um pensamento único ao mundo - e nós não fizemos o debate da crise do capitalismo, que vinha da irresponsabilidade da banca, na proporção que deveríamos ter feito.
Para quê? Para tirar as lições e para firmar a necessidade de refazer a leitura do caminho estratégico.
Em 2010, nos limitamos a fazer exatamente um processo eleitoral da forma tradicional, discutimos pouco a crise lá fora. Empobrecemos o debate ali, no processo eleitoral. E não é responsabilidade de A ou de B, mas todos nós somos responsáveis pelo padrão do debate que se estabeleceu. Outros provocaram a forma do debate que descambou muito mais para uma luta eleitoral do que para uma luta política, descambou para assuntos mais religiosos do que para um projeto de desenvolvimento de um país e de uma nação.
A partir dali, começamos a viver uma outra etapa, uma etapa em que as ferramentas utilizadas para anabolizar um determinado crescimento não funcionam como antes. E o Brasil vive três anos em sequência de baixo crescimento econômico, onde se começa a colocar em risco as conquistas que tivemos num passado recente, as conquistas que tivemos não só no plano institucional, no plano democrático.
As instituições começam a ser colocadas mais e mais em questionamento quando a sociedade, cada vez mais incomodada com os pactos políticos, incomodada com as práticas políticas, cada vez mais incluída digitalmente, vendo um Estado analógico com respostas precárias a políticas públicas essenciais, fundamentais para muitos trabalhadores e trabalhadoras, que já não suportam mais a condição de ficar 4, 5 horas por dia dentro de um transporte público cada vez mais ineficiente, numa situação que põe em risco, efetivamente, as conquistas econômicas que tivemos.
Sobretudo se olharmos o que ocorre com a indústria brasileira neste instante, não conseguimos estancar um processo de desindustrialização que nos preocupa sobremaneira - e nós temos que ter um olhar também às conquistas sociais.
Essas conquistas ainda são muito incipientes. Esses milhões de brasileiros que conseguiram um precário trabalho, com uma renda ainda muito baixa, têm hoje, em média, um endividamento que pode representar a metade da renda familiar, ou um pouco mais da metade. Se não retomarmos o ciclo de crescimento econômico, veremos aqueles que ascenderam três ou quatro degraus, descer essa escada de uma vez - em uma situação muito mais vulnerável que antes, carregados, sobretudo, de frustração, de dívidas e de desesperança.
Isso é tudo que não precisamos ver na vida brasileira. Um povo que não tenha esperança de lutar e de construir dias melhores, não vê os obstáculos que são colocados pelos interesses dos que querem manter o desequilíbrio social.
Essa preocupação é o que nos motiva a fazer esse debate nesse momento. Um debate que não é absolutamente contra quem quer que seja. Um debate que não pretende negar a nossa história, a nossa caminhada, e as conquistas que construímos juntos. Mas um debate que tenha, sobretudo, a pretensão de olhar para o futuro do Brasil. E olhar para o futuro do Brasil exige um debate muito mais complexo do que o primarismo a que muitas vezes tentam submeter o debate político no Brasil.
Nós recebemos do PPL um documento para o início desse diálogo. Esse documento trata de teses, de pensamentos e de valores. Eu trago hoje a resposta do PSB, dizendo que são acolhidos fraternalmente pelo nosso partido. Como início de conversa, com muito interesse em fazer esse diálogo nessa perspectiva da história, na perspectiva do que nos trouxe até aqui, da valorização dos passos e das conquistas que tivemos, na necessidade de termos o cuidado com os acúmulos que fizemos na vida pública até aqui e, sobretudo, que tenhamos a ousadia para seguir levando a luta popular brasileira e o desejo de construir mais.
Dentro deste país que mudou, há um outro Brasil, que quer ir muito mais além. Há um outro Brasil que ainda vê muita injustiça, muito desequilíbrio, muitas oportunidades perdidas, que só serão conquistadas se tivermos a oportunidade de fazer um debate de longo prazo.
Não é a discussão da eleição de 2014, que é muito pouco para a etapa histórica que estamos vivendo. Outros blocos, outros países, estão nesse momento fazendo debates que são muito mais profundos do que juntar partidos, tempo de televisão e bancada para votar.
Nós acabamos de assistir a China fazer um grande processo de debate interno, o Partido Comunista chinês fez, com toda a sua experiência de um país que cresce como cresce, e ganhou relevo, como ganhou, numa conjuntura internacional - e que teve de refazer toda a sua compreensão de desenvolvimento interno, de inclusão, de fluxo populacional, de setores econômicos para focar, de matrizes energéticas, de conceitos de cidade e sustentabilidade, olhando para os próximos 10 anos.
Se nós formos ver de perto o que os americanos estão fazendo neste momento nos EUA, e fora dos EUA, em termos de matrizes energéticas – e buscar de volta as fábricas que eles mesmos exportaram em busca de trabalho barato; se olharmos para a Europa e ver o que há de mudança política, foram 12 governos substituídos, na União Europeia, nesse período. Há uma luta intensa pela preservação de direitos conquistados por lutas históricas na Europa. Há um debate irrequieto na academia, mundo afora, em busca de qual é a conceituação institucional para a nova democracia, para respostas que o mundo vai ter que dar a um ciclo de desenvolvimento onde muitas das possibilidades foram esgotadas, sobretudo o padrão de acumulação do capital como ele vinha se dando, vis-à-vis a qualidade de vida, a questão das riquezas naturais.
Esta é uma grande oportunidade para a esquerda, daqui e do mundo, fazer um debate diante de uma crise como a que veio em 2008, diante de uma inquietação social enorme - e nós não podemos mediocrizar o debate neste instante, pelo contrário, nós precisamos embalar esse debate com toda a fraternidade, mas com a grande inquietação de produzir um pacto novo, um pacto social que carregue bandeiras, desejos e sonhos que para nós não são novos. O que as pessoas colocaram nas ruas em junho, são bandeiras que nós carregamos ao longo das nossas vidas todas e nossos partidos sempre abraçaram.
Mas é a hora de construir exatamente a visão de como conquistá-las no tempo de hoje. E eu estou convencido, por tudo que tenho ouvido de tantas pessoas experientes - de pessoas que estão nessa luta há muitos e muitos anos, e que têm experiência histórica não só em lutas aqui no Brasil, mas fora do Brasil - que nós não vamos produzir nada de novo que anime o nosso povo com esse pacto político que está aí. Ele cumpriu um papel - e é preciso que tenhamos coragem.
Sempre temos que ter a capacidade de fazer o novo a partir de experiências e daquilo que fica da velha caminhada. Temos de ter respeito com a caminhada que nós compartilhamos, mas temos que ter, sobretudo, respeito com o futuro do Brasil. E esse respeito com o futuro do Brasil nos obriga a fazer esse debate que propõe o PPL, o PSB, a Rede e outros partidos, e que é preocupação de muitos companheiros que estão no PT, no PDT, no PCdoB, em outros partidos, que é a busca, exatamente, de orientar o pensar estratégico para a próxima década.
O Brasil está diante de uma janela demográfica, nós temos 20 anos em que ainda seremos um país jovem. É como se o Brasil tivesse 25, 30 anos de idade e tenha que definir o que vai fazer, como é que vai caminhar na vida para se consolidar na boa idade, lá na frente. Nós temos que decidir se nós vamos jogar fora o país nesse século ou se nós vamos ocupar essa janela e fazer mudanças que precisam ser feitas, que não podem ser adiadas.
Então, acho muito importante que possamos seguir - e esse Congresso será um instante em que a militância de todo o país, que aqui está para discutir temas como ciência e tecnologia, como política econômica, como as riquezas naturais, como a questão cultural, tudo isso é fundamental - para construir uma base de entendimento programática que possa guiar a nossa luta. Para que nós não possamos ser chamados para a luta eleitoral tradicional, pois não é esse o nosso encanto. Não é esse o nosso papel.
O nosso papel é enxergar o outro caminho, o caminho que vai tomar conta e preservar as nossas conquistas, mas que, sobretudo, vai abrir a estrada para que a luta popular brasileira prossiga, construindo inclusão, um país soberano, um país para os brasileiros, um país feliz, um país equilibrado.
O PSB tem uma esperança muito grande de poder, com a ajuda do PPL, significar uma possibilidade para o povo brasileiro. É por isso que estamos aqui, de maneira fraterna, para abraçar os amigos de sempre. Não estamos aqui como amigos eventuais de um projeto eleitoral ou um projeto de poder. Esse caminho não nos encanta. Nós estamos atrás de um projeto para o Brasil, um projeto que possa estar à altura da história dos que estão aqui neste auditório, que não estão a fim de estarem constrangidos por alianças que matam o sonho, por alianças que freiam o desejo de ir mais longe, e que impossibilitam as mudanças.
É por isso que aqui estamos agradecendo Sérgio, Miguel, a todos, ao Bira, a todos os companheiros que têm construído esse diálogo, ao Pedro, a todos vocês, agradecendo por esse jeito que estamos fazendo esse diálogo, um diálogo que está à altura da nossa história e que carrega muito esperança de que, juntos, haveremos de fazer a boa política, vencer - e vencer as nossas bandeiras de sempre, que são as bandeiras da construção de uma nação soberana e feliz.
Muito obrigado.

Fonte: http://www.horadopovo.com.br/

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